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domingo, 17 de julho de 2011

ITAPIRA, UM DOS PALCOS DA REVOLUÇÃO DE 1932

PARTE I









O Movimento Revolucionário ocorrido em terras bandeirantes no ano de 1932 tem suas raízes bem antes, em 1924 e 1930.





Getúlio Vargas que assumiu o poder na década de 30 deveria representar o avesso da “Velha República”, carcomida, cheia de vícios e elitizada. Assumiu e, demorava em partilhar o poder e, ao contrário, fechou o Congresso, Câmaras Legislativas, destituiu do poder executivo quase todos os políticos e colocou em seu lugar os interventores (militares). Os políticos e generais, principalmente os de São Paulo, esperavam por um governo idealizado que, implantado, acabaria com as benesses do poder e as diferenças sociais. Foi a Aliança Liberal que colocou Vargas no poder e, esta mesma aliança se colocaria contra Vargas em 32. São Paulo, que era a locomotiva do Brasil, queria voltar ao poder. Getulio Vargas continuava governando sem acenar mudanças e prometendo a constituição. Os ideais democráticos, a pobreza, os intelectuais, a intervenção militar, os agitadores, o nepotismo, os estudantes, a repressão, a política, as dificuldades da economia, tudo isto, fermentava num mesmo caldeirão, que era São Paulo, além das expectativas de brasileiros dos outros Estados.

O ano de 1932 apresenta seus primeiros heróis: Euclides Bueno Miragaia, Antonio Américo de Camargo Andrade, Dráusio Marcondes de Souza e Mario Martins de Almeida. Mortos pela policia comandada pelo interventor de Vargas em São Paulo, num comício monstro ocorrido no centro da cidade. Esses nomes serão a forja e o martelo da revolução constitucional: MMDC.








Os milicianos constituintes: Isidoro Dias Lemos, Bertoldo Klinger e Euclydes de Figueiredo sabiam que o nosso Estado apenas não poderia enfrentar o Exército Legalista, contava com a aliança do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais. Outra dúvida era se, o Exército e Força Pública iriam apoiar o movimento. A facção do Exército sediado em São Paulo se levantaria junto com o povo paulista para derrubar o ditador e fazer o país voltar ao estado constitucional? Eram só os paulistas que estavam descontentes com a Ditadura Vargas? Minas e Rio Grande do Sul se uniriam para o levante? Na capital federal os militares descontentes agiriam em favor dos constitucionalistas? Quais as conseqüências diretas ao povo bandeirante deste ato de insubordinação ao governo central brasileiro?



Isidoro
Klinger
Pedro de Toledo















O General Isidoro Dias Lopes foi o catalisador dos militares. Foi marcada a data, que não era o 9 de Julho. Seria dia 14. A antecipação é feita pelo General Klinger. O Interventor Paulista, Pedro de Toledo assumiu o Governo do Estado em caráter revolucionário, abandonando o poder dado por Vargas. Por desencontros e desinformações, a data foi antecipada pegando os militares cariocas de surpresa. Esperando a não agressão dos mineiros e união com os gaúchos, São Paulo se levanta. A revolução não duraria 96 horas. Sem derramamento de sangue e nem maiores sofrimentos. Num telegrama enviado aos chefes militares do nosso Estado, Euclydes de Figueiredo diz: “ ...Comunico-vos que, em nome do povo de São Paulo e apoiado pela unanimidade das tropas federal e estadual deste Estado, revoltadas, e de acordo com o General Isidoro Dias Lopes, assumi o comando da II Região Militar, com o fim de exigir do governo provisório reconstitucionalização do país e restabelecimento do regime de Ordem...”

Getulio sempre informado dos acontecimentos, consegue convencer Minas e Rio Grande do Sul a não marcharem junto com os paulistas. Somente uma parte de Mato Grosso acompanha os bandeirantes pois, os federais já haviam se colocado no caminho entre os nossos Estados para evitar o fornecimento de armas e munição. Da mesma forma em Santos. A Marinha fechou o porto e até um navio lotado de preciosas armas e outros itens, fora confiscado. Os aviões que viriam da Argentina e do Chile, não chegaram. Para a população brasileira, bastante desinformada, a propaganda getulista avisava que São Paulo queria se separar do Brasil. Que o movimento vinha de um bando de desordeiros e agitadores, italianos e comunistas que desejavam tomar o poder pelas armas. Vargas, na verdade, desde 1930, vinha desmilitarizando o nosso Estado.


São Paulo teve o apoio dos paulistas como um todo. 200 mil voluntários de apresentaram para a luta. 40 mil lutaram. 800, oficialmente, tombaram no solo paulista até o final do mês de setembro. Não oficialmente, 2.000 paulistas morreram no evento. As estatísticas das mortes das forças legalistas nunca foram divulgadas. Os paulistas enfrentaram mais de 300 mil soldados legalistas bem mais equipados. Foi o maior evento bélico em terras brasileiras, envolvendo o exército e povo. Uma guerra civil. Foi o movimento que procurou fazer o país voltar ao Estado de Direito, pois, o Governo Central singrava numa das mais brutais ditaduras. Foi o evento que é perpetuado, admirado, comemorado pelos vencidos e não, pelos vencedores.


No final de julho, as forças federais, avançavam sobre São Paulo. Itapira, por estar numas das portas de entrada dessas forças, tornou-se ponto de convergência das forças militares conflitantes. Itapira mereceu que o irmão de Vargas, fosse o comandante da força. Os federais não esperavam tamanha resistência dos soldados constitucionalistas. Os combates foram ferrenhos e muitos tombaram em Eleutério e Sapucai. Há episódios no Barão Ataliba Nogueira, bairro dos Pires e o principal, no Morro do Gravi. Novamente o soldado de São Paulo mostra seu valor, apesar da falta de experiência (grande parte dos homens eram voluntários), da falta de munição, da falta de armas mais potentes e de substitutos. Havia mais soldados prontos a dar sua vida por São Paulo que armas e munições disponíveis. O abandono da Força Pública do teatro da batalha, no começo de outubro, dá o golpe de misericórdia no movimento.
De igual modo, se deram os combates em outros fronts. As forças legalistas, esmagadoras e bem municiadas, foram vencendo e minando a resistência do nosso povo. As universidades paulistas, as mulheres, a contribuição em ouro foram decisivas para que São Paulo agüentasse o cerco que durou três meses.










Ela começou em 09 de julho e terminou em 02 de outubro de 1932. Para Itapira, ela começou no meio de julho e terminou nos primeiros dias de setembro. Na placa colocada no Morro do Gravi, consta a data de 04 de setembro de 1932, que suponho, seja a tomada do local pelas forças legalistas. Quando os comandantes paulistas desistiram de lutar, somente confirmava o esgotamento total de condições de continuar a luta. O Governo federal marcara a invasão final para as 8:00hs do dia 02 de outubro e os militares paulistas envolvidos, preferiam o armistício. mas o Governo Vargas aceitava somente a rendição.


Na Escola Politécnica e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas passaram a criar novos armamentos, uma vez que as fronteiras estavam fechadas e o Porto de Santos cercado. Foram feitas granadas, morteiros, canhões, e munição. As indústrias, capitaneadas pela Fiesp, produziram todo esse material, incluindo aí o Trem Blindado, carros de guerra, etc. A matraca foi um equipamento criado para imitar rajadas de metralhadoras e iludir os inimigos. Os canhões fantasmas também. A maioria das armas usadas eram pertencentes aos próprios voluntários.






Trem e Carro blindados




As associações paulistas de mulheres, como a Liga das Senhoras Católicas, contribuíram com grande afinco durante as batalhas, produzindo alimentação, roupas, material de higiene, envasando água, etc. Nas Santas Casas, o trabalho delas, foi fundamental para o atendimento aos feridos, doando todos os recursos e horas de atendimento







O correio da revolução funcionou de forma excelente e precisa.








A campanha do ouro para São Paulo foi outra grande idéia, pois, todos contribuíram, desde os mais ricos até os de menos posses. Bispos, Advogados, Médicos, Engenheiros e Industriais. Até uma moeda paulista foi criada.
Tudo isto aconteceu nas cidades de conflitos. Itapira foi uma delas. Verificando os livros à nossa disposição no museu histórico, pude coletar algumas informações importantes:

João Torrecillas Filho, no jornal A Cidade de Itapira ( várias crônicas)
“O ANO DE 1932

Os rinques de patinação existentes aqui, em numero de dois, Cine Recreio e Agencia Ford, foram depredados e saqueados pelos soldados das forças Federais.
Ele, como testemunha dos acontecimentos, relata que as casas eram arrombadas e saqueadas, com a gente itapirense sendo humilhada pelo Delegado Militar, Mascarenhas; ver cavalarianos do sul atropelarem senhoras e crianças nas calçadas; o carregamento em caminhões lotados que seguiam para Minas Gerais com móveis, máquinas de costuras, roupas e tantas coisas pertencentes aos moradores; cita ainda que um militar de São João Del Rei, furtou uma flauta de prata de Mário Rovaris e que após o término da revolução voltou a seu dono.”

Marcio Carlos
“DEPOIMENTO
RUBIS INACIO DA ROSA – 84 ANOS – NASCIDO EM MINAS GERAIS (ALBERTINA) EM 1927
ESTÁ EM ITAPIRA DESDE 1983 – FOI CASADO COM JOSINA ALVES DA ROSA (FALECIDA EM 2011)





Na época, tinha 5 anos de idade e, pode descrever o seguinte:
“... morava nesta época em um sitio na cidade de Albertina, cidade que não fazia divisa com São Paulo. Cidade pequena e agrícola. Vi um avião pequeno que ao fazer um vôo rasante, deixou cair 3 bombas que explodiram, sem deixar feridos ou destruir algo, pois, caíram em terrenos de plantio. Seu tio que era construtor, ao perceber a aproximação do avião, se escondeu na própria casa que erguia, ficando preso num buraco, tendo recebido ajuda para sair do local. Foi um grande susto. Após, mais nada aconteceu. Soube dos acontecimentos em Eleutério que foram bastante sérios e com muitos mortos. Penso que São Paulo se considerava muito forte e importante, que desejou se separar do Brasil. Em relação à luta, não foram os mineiros que invadiram Itapira mas sim, os soldados do nordeste que acostumados com as agruras da vida, se confrontaram com os paulistas...”

Odette Coppos

“Depoimentos.
Alcides de Oliveira, disse que transportava os feridos com o caminhão. Com veículo, por ordem do Cel Chico Vieira, foi até a Capital buscar armamentos e soldados. O Cel Chico Vieira contava organizar um batalhão formado por Alcides, Caetano Munhoz (funcionário público), Quinzote Venâncio (escrivão de policia), do padre Luiz de Abreu, do Professor Pedro Ferreira Cintra. Vinte dias após as forças federais ultrapassarem Eleutério, fizemos trincheiras na Avenida dos Biris, no bairro dos Pires, no sitio dos Poletines e no morro do Gravi. Este último, julgado inexpugnável. Trouxeram um canhão de 75 mm., que foi posicionado na Av. do Biris, que pensávamos, atingiria longe as tropas inimigas. O disparo foi um fiasco. A bomba foi cair no Cubatão, ali pertinho. Nesse momento, a cidade contava com 120 homens e armamentos velhos e pouca munição. A resistência foi no Gravi. Foi no final de agosto que o confronto aconteceu lá. Muitas baixas de ambos os lados. Até um “vermelhinho”, avião federal, foi derrubado no morro. Além de muitas mortes, foram os paulistas capturados e rendidos.






Dr. Hortêncio Pereira da Silva (Itapirense), desenterrando ossadas de voluntários no Morro do Gravi
Irmã Angelica Maria, contou que trabalharam no atendimento aos feridos, os doutores Hortêncio Pereira da Silva, João Cunha e Névio Bicudo; os enfermeiros: Therezinha Fonseca, Domingas Bueno e Thereza Sarri. Toda a medicação era manipulada na Santa Casa. Antibióticos e soros eram desconhecidos. Como o atendimento aos feridos se tornou elevado, os farmacêuticos Antonio Serra e Aquiles Galdi, permaneciam todo o tempo na Santa Casa, que era composta de um pavilhão central, casa das Irmãs, dois pavilhões menores para homens e mulheres, a sala de operações e mais três quartinhos particulares. Atravessava a Instituição tempo de penúria. Com a vinda do Dr. Mario Franca, do Rio de Janeiro, bondoso e humanitário, comprou várias camas e outros móveis para os atendimentos. Do primeiro combate, a oito quilômetros de Pouso Alegre, atenderam mais de trinta feridos e oito mortos. A maioria eram jovens de famílias da sociedade, de boa aparência e nenhuma experiência de guerra. Foram cortados, no meio do mês de agosto, a luz elétrica e o telefone. Os federais queimaram toda a roupa do Hospital e levaram todo o material cirúrgico. Com a tomada de Itapira, fomos todos chamados a ir para Campinas. Os canhões se aproximavam do centro. Aviões bombardeavam Barão Ataliba Nogueira, Eleutério,o Tanquinho e o próprio centro da cidade.

Quando voltaram no final de setembro para a Santa Casa, encontraram tropas federais ainda instaladas que permaneceriam mais um mês no local.
José Benedito da Silva, conta que soube do lamentável acontecimento com quatro jovens da cidade de Rio Claro que participavam do 14 Batalhão de Itapira. Escondidos junto ao tronco de uma árvore, na divisa com Vergel, uma das bombas de canhão, caiu exatamente onde estavam, matando-os. Foram enterrados por mãos piedosas e posteriormente, com a vinda dos parentes, levados para a terra natal.

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